Lendas japonesas

O coelho da lua

                                                       Sob a noite sólida de uma floresta no Japão antigo, reuniam-se três grandes amigos:  A inteligente raposa, o ágil macaco e o pacífico coelho branco.
           Da lua cheia que reluzia no céu, o Velho da lua os observava, pensando consigo mesmo, qual deles seria o mais virtuoso. Sem delongas, resolveu testá-los, disfarçando-se como mendigo e apresentando-se diante deles: “Tenho fome”
                Ao ver aquele maltrapilho humano necessitado de ajuda, a raposa teve dó, e correu para o rio. Utilizando-se de sua inteligência, atraiu os peixes com sua cauda e pescou algum deles com os afiados dentes. Deu-os ao mendigo para que matasse sua fome.
                O macaco também querendo ajudar, usou de toda sua agilidade para escalar um caquizeiro, apanhando as mais altas e coradas frutas da árvore. Deu-os ao mendigo para que matasse sua fome. 
O coelho sem ter a agilidade do macaco ou a inteligência da raposa, nada parecia poder fazer pelo mendigo, mas seu generoso coração não lhe permitia que se fosse sem que pudesse ser de alguma ajuda.
“Amigo macaco, pode trazer um pouco de lenha?” perguntou ao amigo. “E você amiga raposa, pode fazer uma fogueira da lenha que ele trouxer?”
                Os amigos o fizeram. Quando as labaredas das chamas começaram a subir ao céu, o coelho atirou-se ao fogo, oferecendo ao velho a carne que saciasse sua fome.
                Espantados com o acontecido, o macaco e a raposa choraram por seu amigo, reconhecendo que o coelho era a criatura mais generosa da floresta.
                O velho maltrapilho foi envolto por uma áurea prateada, voltando a ser o nobre espírito da lua.
“Não se preocupem, seu amigo está bem”
Ao dizer isso, o velho trouxe de volta o espírito do generoso coelho.
“Seu ato foi de muita bondade, provando que é o animal mais generoso da floresta, entretanto não deve fazer mal a si mesmo, ainda que seja pelo bem de outro.”
“Mas o que será agora de nosso amigo?” perguntou a raposa, ao velho.
“Eu o levarei comigo para a lua, e de lá, com toda sua virtude, ele olhará por vocês sempre”
E aconchegando o coelho em sua manta cálida, o Velho subiu aos céus.
Dizem que até hoje o coelho da lua olha por aqueles de corações generosos enquanto se diverte fazendo bolinhos de arroz para enviar a seus amigos que ficaram na terra, a raposa e o macaco.


A tecelã de nuvens

muito tempo atrás, na terra do sol nascente, Sei, um jovem agricultor estava preparando suas terras para o plantio.

Sozinho no mundo e muito triste, pois a mãe, que era tecelã, havia falecido recentemente e não havia ninguém para ajudá-lo nessa tarefa.

Eis que estava ele semeando e, de repente, viu uma cobra rastejando no chão.
Sei percebeu que a cobra deslizou firmemente em direção a uma moita de crisântemos, onde havia uma aranha suspensa por um fio de seda da teia. A aranha fez Sei lembrar da mãe - pequena e indefesa - e imediatamente levou a cobra para bem longe com seu ancinho.
A aranha, surpresa com a bondade de Sei, olhou para ele. Sei nunca percebeu, pois além da aranha ser pequena, ele havia retornado ao trabalho.

Passado alguns dias, uma jovem bateu à sua porta. ela se curvou e perguntou se ele precisaria de alguém para tecer.
Sei ficou surpreso, pois ele realmente precisava, mas não havia comentado com ninguém desde a morte de sua mãe e perguntou à jovem:

- Como você sabe que preciso de alguém?

Timidamente, a jovem respondeu:

- Eu sei. Ficarei feliz se puder ajudar.

Muito feliz e grato, Sei levou a jovem ao quarto de tecelagem de sua mãe. Enquanto a jovem trabalhava tecendo, Sei continuou seu trabalho no campo.

À noite, Sei voltou pra casa, bateu na porta do quarto de tecelagem e, já pensando que ninguém poderia ser comparado à sua mãe, perguntou:

- Terminou alguma obra?

A jovem abriu a porta e, para sua surpresa, segurava em cada braço, uma dúzia de belas peças de tecido, suficiente para um quimono.

- Impossível, como pode fazer tantos? perguntou Sei.

A jovem apenas respondeu:

- Prometa que não vai mais fazer essa pergunta, nem entrar no quarto enquanto eu estiver trabalhando.

- Eu prometo - respondeu Sei.

Dia após dia, Sei descobria que a jovem havia tecido peças cada vez mais bonitas e delicadas.
Até que um dia, Sei implorou à jovem:

- Por favor, diga como você consegue fazer tantas e tão belas peças.

Ela apenas respondeu:

- Lembre-se de sua promessa.

Após algumas semanas, a curiosidade o venceu. Em uma tarde, em direção à sua casa, Sei viu a janela do quarto de tecelagem aberta e pensou que não estaria quebrando a promessa, caso espiasse.
Silenciosamente e na ponta dos pés, olhou pela janela.
Sei quase desmaiou.

Diante do tear não havia nenhuma jovem, mas uma enorme aranha com oito pernas. Sei não acreditava, olhou de novo.
Lembrou-se da pequena aranha que tinha ajudado e entendeu que esta era a sua recompensa.

Sei não sabia como expressar sua gratidão, ao mesmo tempo não queria que soubesse que tinha quebrado a promessa.

Sei percebeu ali, que a aranha precisava de mais algodão.

No dia seguinte, antes do amanhecer, Sei partiu para uma aldeia distante em busca de algodão.
Comprou e colocou o pacote em suas costas.

Cansado do peso e, depois de muito tempo, quando chegou ao topo, parou e sentou-se em uma pedra para descansar. Sei cochilou e não percebeu a mesma cobra que ele havia expulsado algumas semanas atrás.
A cobra o viu e não perdeu a chance. Entrou no pacote de algodão que Sei trazia.

Chegando em casa, Sei entregou o pacote à jovem. Ela se curvou agradecendo, sorriu e voltou para o quarto de tecelagem.

No quarto, a jovem se transformou na aranha. A aranha começou a consumir o algodão, engolindo o mais rápido possível para que pudesse girar em fio de prata.
Quando chegou ao final do pacote, inesperadamente, a cobra apareceu abrindo a boca.

Aterrorizada, a aranha saltou pela janela. Mas a cobra a alcançou.

Quando estava prestes a engoli-la, um raio de sol que atingia o punhado de algodão que saía pela boca da aranha, levantou-a e puxou para o céu.

Para mostrar sua gratidão, a aranha usou todo o algodão que tinha engolido, não mais para tecer pano, mas para tecer flocos de nuvens no céu.

Por isso, em japonês, a palavra "kumo" significa nuvem e aranha.